A paixão da rádio
Cresci ao som da rádio. Das vozes de ouro do Rádio Clube, dos Emissores Associados, da Emissora. Das canções do Tony de Matos, António Mourão, Juan Manuel Serrat. A televisão tinha dois canais, umas horitas por dia, a preto e branco. E só chegou lá a casa no fim da infância.
Foi pela rádio que tivémos notícia dos tempos conturbados na capital. O 25 de Abril, os comunicados do MFA, e depois as escaramuças sem fim. A rádio era, então, o nosso elo de ligação com o mundo. Nunca mais se fizeram noticiários de rádio como os dos anos 70.
Foi pela rádio que, depois, comecei a gostar de música. Havia lá gira-discos numa casa rural de uma família remediada… A primeira colecção de música que tive foi uma caixa de sapatos com cassetes gravados na rádio. Dos tempos inesquecíveis do Programa 4, FM Estéreo (!!). De programas como o Dois Pontos, nas suas várias versões, um imenso gira-discos, numa altura em que, na província ainda nem discos havia.
E depois vieram os programas que marcaram. Rádio a sério. O Café Concerto, o Homem no Tempo, os programas do Paulo Coelho.
Foi ainda a rádio que me deu o primeiro salário regular. Não tinha grande jeito para aquilo. Não tinha voz, pensava eu na altura. Percebi, depois, que a principal dificuldade nem era essa. Era não ser parente de gente conhecida, não ter cartão de partido. Enfim, coisas que o tempo não resolveu.
Hoje não há rádio. Há ilhas de rádio, aqui e ali. As playlists, a televisão e a desorientação geral do país mataram a rádio. Hoje, quando compro um carro, um dos principais factores de escolha é a qualidade do leitor de CD.
Por isso, a rádio é, para mim, mais nostalgia que outra coisa. Tenho saudades do sinal horário da Antena 1, como tenho dos spots da TSF com as vozes da Flor Pedroso e do Fernando Alves.
Por isso, mas não só, passo frequentemente pelo Retorta. E comovo-me com as imagens dos alinhamentos de programas passados. Com a paixão pela Íntima Fracção, que partilha com a Janela Indiscreta.
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