quarta-feira, 3 de setembro de 2003

Vamos lá a ver...

Valerá a pena um dia voltar à questão do tratamento desigual que os media dão à extrema-esquerda e à extrema-direita. Na resposta que JPP deu às reticências que levantei a um seu apontamento, há, porém, duas ou três coisas sobre o funcionamento dos media que penso ser de algum interesse esclarecer.
1. Comecemos por José Manuel Fernandes. Como nota JPP, tornou-se no alvo predilecto durante a guerra do Iraque. Esse foi um debate que se centrou, especialmente, nas páginas do Público, o que revela um espírito de abertura assinalável. Mas que ilude um dado estatístico que muita gente teima em ignorar. Tomem-se os editoriais (ou os directores, para o caso tanto faz) dos chamados jornais de referência. Que disseram eles durante a guerra do Iraque? Menos assertivamente (em alguns casos, nem isso...) exactamente o mesmo que José Manuel Fernandes. Simplificando, defenderam os pontos de vista dos EUA. Para que não restem dúvidas do que falo, falo do Público, do Diário de Notícias e do Expresso. Para a balança de JPP até dou uma borla: a Visão, que se destacou pela posição contrária. Não percebo, por isso, que diabo de consenso quebrou o director do Público.
2. Isto leva a outra questão levantada por JPP, a do «clima de esquerda» que alegadamente se vive nos media. Peço um favor a JPP - que releia todos, repito, todos os editorais dos jornais que referi escritos no último ano. E que releia os editoriais, todos, dos mesmos jornais no último ano do guterrismo. E gostava que JPP me dissesse onde encontra esquerda, quanto mais esquerdismo, nesses textos.
3. Como JPP sabe, outra das formas de verificar a orientação ideológica dos jornais é através do seu elenco de colunistas permanentes. Aqueles que dão alguma espessura aos locais em que escrevem. Quais são os colunistas de luxo do Público? E os três diários do DN, qual a sua filiação ideológica? E JPP já se deu ao trabalho de ver quem são os colunistas fixos do Correio da Manhã, um jornal que mudou o seu perfil nos últimos meses?
4. Lamento, por isso, informar JPP, mas os principais media nacionais não são, actualmente, do Bloco Central. Estão alinhados com a coligação governamental. Nem que, em casos específicos, seja através da despolitização agressiva dos seus conteúdos. Ou JPP não concorda que nada agrada mais ao poder que a despolitização dos media? E nem vale a pena chamar aqui a questão da propriedade levantada por JPP a propósito da TSF...
5. JPP fala das background assumptions. Percebo onde quer chegar. Recordo-lhe só que quem faz as primeiras páginas são os directores. Sim, eu sei. JPP refere-se, principalmente, aos textos das secções de política, talvez das de internacional. Esse é um dos pontos em que, grosso modo, concordo com JPP.
6. JPP deixa entender que os media sentem um grande fascínio com o Bloco de Esquerda e questões conexas, como a anti-globalização. Os media, como JPP sabe, têm uma tendência congénita para correr atrás dos foguetes. E, como sabe, o BE é especialista em foguetório. Há uns anos, os media corriam atrás da dupla Manuel Monteiro / Jorge Ferreira, inchando desmesuradamente o CDS/PP.
7. Há uma questão que, de facto, chamei ao debate de forma supérflua - Paulo Portas. Utilizei o tema como mero ponto geográfico de comparação, mas as posições de JPP nessa matéria já eram do domínio público.