terça-feira, 25 de novembro de 2003

Os diogos

Um amigo insistiu: «Tens que ler. O gajo escreve bem. E tem umas ideias interessantes. É aquilo a que agora se chama a direita inteligente».
Consumidor mais ou menos regular da Veja, nunca tinha parado muito no tal Mainardi. Diogo Mainardi. Aconteceu esta semana, num artigo chamado «A tunga do Estado» (para ler na Net é preciso ser cadastrado e pagar assinatura).
O Diogo dedica duas colunas a desmentir o ministro das Finanças do Brasil, o qual tinha afirmado que o Estado gasta mais com os ricos do que com os pobres. Isto porque o tal Palocci quer aumentar os impostos pagos pelos ricos.
E ele, Diogo, rico que é, só usa serviços privados. Ele refere a educação, a saúde, os transportes. Mas, pelo tom que utiliza, presumo que também utiliza estradas privadas, praias privadas, que tem um sistema de recolha de lixo só dele, que, no caso de ser assaltado, será ele a prender o ladrão, julgá-lo e depois mantê-lo na prisão. Serviços do Estado ele não utiliza, não senhor.
Em abono das suas teses, o Diogo atira depois com duas ou três verdades, daquelas que doem a valer. Por exemplo, que «as universidades públicas europeias oferecem vagas a todos os alunos, não só a uma minoria» como acontece no Brasil. A que Europa se estará a referir o Diogo?
Ao rol das verdades incontestáveis, o Diogo junta outra. Ele é contra a «cobrança de mensalidades nas universidades federais» e alega mesmo que «se eu pago mensalidade é porque a universidade é privada». A malta de Coimbra e o resto da estudantalhada que anda aos gritos contra as propinas têm de trazer este Diogo a Portugal.
E, enfim, o Diogo vai por aí fora. Imparável na prosápia e no disparate. «O Estado não dá nada aos pobres. E não dá nada aos ricos.»
O nosso Diogo não escreve mal. Mas acho que já vi melhor. De igual, nem se fala. Mas o Diogo tem o problema de muita gente que conheço e que escreve bem - escrevem tão bem que se dispensam de pensar. Ao correr do teclado, ditam verdades absolutas a cada parágrafo. Imparáveis, declaram todos os que com eles não concordam de mentirosos, pouco inteligentes, ou mal-formados.
Na aversão ao Estado, no desprezo com que tratam todos os que com eles não concordam, estes diogos vivem em estado de barbárie latente.