sábado, 15 de novembro de 2003

Os jornalistas portugueses e as guerras

Agora que o Carlos Raleiras foi libertado, três notas sobre o envio de jornalistas portugueses para teatros de guerra. Sei que a última é, no mínimo, pouco consensual. Paciência.
1. São quase criminosas as condições em que as empresas de media portuguesas enviam jornalistas para teatros de guerra. Como notaram nos últimos dias o repórter Mário de Carvalho, da CBS, Carlos Fino e um português que trabalha na BBC, ouvido pela SIC, a generalidade dos media estrangeiros faz acompanhar os seus jornalistas de segurança própria, pelo menos nos casos em que a situação é mais volátil. A hiper-elogiada capacidade de desenrascanço dos portugueses será um factor com que os patrões contam. Há casos em que isso entra em zonas de puro crime - por exemplo, quando dezenas de jornalitas portugueses foram enviados para o Paquistão/Afeganistão sem terem sequer um seguro de vida.
2. É óbvio que, mesmo em condições de aparente total segurança, tudo pode acontecer. O jornalismo de guerra será sempre uma profissão de risco. As notícias menos agradáveis têm, pois, de ser encaradas com alguma naturalidade.
3. Considero uma disparatada feira de vaidades o envio de hordas de jornalistas portugueses para palcos de guerra. Parece-me que isso seria natural em casos de proximidade, por exemplo, afectiva, como aconteceu com Timor, Angola ou Guiné-Bissau. Já acho dificilemente compreensível o que se passa com o Iraque. É preciso lembrar que a generalidade dos media nacionais nem sequer têm uma rede nacional decente de correspondentes. Alega-se que o envio de jornalistas se destina a dar uma visão portuguesa dos acontecimentos. Um disparate: a quase totalidade das reportagens televisivas e grande parte das escritas são meros apontamentos sem qualquer interesse ou qualidade, meros fait-divers. A maior das vezes, trata-se mesmo de ruído que só dificulta a compreensão dos acontecimentos. Os jornalistas portugueses não têm experiência nem habilitações para competirem com os media de grande porte. Prefiro, de longe, os relatos sólidos, bem informados, bem enquadrados, dos jornais e televisões inglesas, americanas, francesas (e mesmo espanholas - a dimensão do mercado permite que no país vizinho se faça um jornalismo de muito melhor qualidade). Ou mesmo das grandes agências, que os medias portugueses podem utilizar.