sábado, 10 de janeiro de 2004

Ainda o Coutinho (desculpem a insistência...)

O texto «Cala-te boca», inserto hoje no Expresso, é um filho exemplar do Coutinho.
Bem escrito, é certo. Mas não exageremos.
E o conteúdo? Enumeremos os dislates:
1. As habituais incorrecções factuais: é preciso distorcer a realidade para que ela se adapte ao que pretendemos escrever. Exemplo: Manuel Alegre não defendeu uma reunião do Conselho de Estado para tratar apenas da cobertura mediática do processo Casa Pia, mas sim de todo o processo. Infelizmente, ao lado do Coutinho, no Expresso, o próprio Alegre encarrega-se de repôr a verdade.
2. Mais explícita sobre a questão da liberdade de imprensa, no Parlamento, foi Assunção Esteves. Mas é do PSD, não dá jeito criticá-la. Além disso, não se presta a tiradas do estilo «a única figura dramática desta República cómica». Acima de tudo, a maledicência deve ser praticada exclusivamente sobre os nossos ódios de estimação.
3. O Coutinho desata depois a elogiar a imprensa. E cega.
Diz que a pedofilia na Casa Pia alastrou durante três décadas perante o silêncio da justiça e dos políticos. Esquece-se de acrescentar: «e dos media». A única reportagem foi feita pelo Tal e Qual, há 20 anos, e ninguém se deu ao trabalho de a continuar.
E diz depois que teve de ser a «terrível imprensa» a confrontar o país com «o fedor». É mentira. O processo Casa Pia começou com uma denúncia (a mãe do famoso Joel) e não com qualquer texto de jornal. O que os media fizeram foi acrescentar fedor ao fedor inicial.
Tudo isto diz o Coutinho porque querem «calar os jornais». Onde terá ele ouvido tal coisa?
Do que muito gente falou foi da necessidade urgente de conjugar a liberdade de imprensa com a responsabilidade. A liberdade, seja ela de imprensa ou de qualquer outra coisa, exige responsabilidade. É assim nos países civilizados de que o Coutinho às vezes diz que gosta.
Mas, enfim, isto é o que eu penso, eventualmente imbuído de uma valentíssima tendência para o equilíbrio sensaborão.