Ao que as meias tintas nos levam. Caso prático: o aborto
Esta nossa mania das meias tintas leva-nos à desgraça. Nunca levamos nada até ao fim, nunca levamos nada a sério.
Veja-se o caso do referendo sobre o aborto.
O legislador, revelando bom senso, teve o cuidado de estipular que os referendos só são válidos se neles votarem mais de metade dos dos eleitores. Ora, no referendo sobre o aborto isso não aconteceu, pelo que o referendo não foi válido. Quer isto dizer que, à luz da lei, da Constituição, esse referendo, melhor, o resultado desse referendo, não existiu, não existe.
Numa democracia madura, o mais normal é que, perante uma questão que claramente divide o país, ao ponto de haver necessidade de fazer um referendo, tudo se fizesse para criar as condições que levassem à realização de nova consulta. É assim nas assembleias gerais, no parlamento, nas mais banais da reuniões - se não houve quorom, vota-se novamente.
Ora o que fizeram os políticos? Exactamente o contrário: assumiram que aquele referendo inválido tinha sido, afinal, válido. Isto é um absurdo gerador das maiores confusões. Acabamos todos num labirinto argumentativo (oh, como gostamos desta balbúrdia de debate), quando a questão era tão simples: bastava cumprir a lei.
[É claro que, ao escrever isto, estou, aparentemente, a alinhar por um dos lados em contenda, no que respeita ao aborto propriamente dito. Mas não é verdade. Essa é outra questão.]
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