domingo, 18 de janeiro de 2004

Fujam... vem aí mais um texto sobre o Coutinho

Deus me guarde de me tornar numa espécie de Provedor dos Leitores do João Pereira Coutinho. Mas, o que querem?, o Expresso já custa três euros e uma pessoa, para não se sentir (muito) roubada, acaba por ler aquilo de fio a pavio.
Esta semana, deveria ter simplesmente feito como A Praia: o texto sobre o aborto é um vómito. Ponto.
Mas não, escrevi uma frase inteira e o Contra-a-Corrente dasata logo a charmar-me de «infectível da objectividade». Ora uma pessoa não se pode ficar perante insultos deste calibre.
O meu problema com o JPC (espero que os fãs não se abespinhem por lhe encolher o nome...) é que nem sei por onde começar. Porque, verdadeiramente, aquilo não tem ponto por onde se lhe pegue. Falo do texto sobre o aborto, como poderia falar de outros abortos produzidos desde que o topo.
Por exemplo, aquela de o aborto não dever ser descriminalizado mas de as mulheres que o praticam não deverem ser penalizadas é uma ideia tão estapafúrdia que nem parece saída de uma arrumada e ilustrada cabecinha de um lídimo representante da direita, mas antes de um anarca espanhol ou de um pacifista indiano - um autêntico apelo à subversão da ordem, à resistência à lei, em suma, à pura bandalheira.
Eu disse bandalheira? Que disparate! Então, não se está mesmo a ver como se conciliam as coisas? «É possível, perante casos concretos, exibir uma sensibilidade sobre a matéria que não passa por uma condenação em tribunal».
A ideia, admitamos, é tão brilhante que deveria ser constitucionalizada. Os deputados deviam pôr, logo no início da Constituição, um parágrafo assim: «Para casos aparatentados a berbicachos, deve exibir-se uma sensibilidade sobre a matéria que não passa por uma condenação em tribunal». Por exemplo, um gajo é pobre, está com uma fome do caraças e dá-lhe para assaltar a pastelaria da esquina. Diz o juiz: «a minha sensibilidade sobre a matéria não passa por uma condenação». O mesmo se poderia aplicar a outros casos bicudos, como o das viagens dos deputados, os quais, bem vistas as coisas, quando viajavam à custa de todos nós era só para satisfazerem as mais que compreensíveis necessidades de amor e carinho das suas amantes... perdão, secretárias.
Quanto àquela coisa de o João (os fãs compreenderão esta minha familiaridade...) se atirar aos abutres dos políticos, eu até o compreendo. Também eu concordo que os deputados em caso algum deveriam preocupar-se com os problemas concretos das pessoas. Deviam, aliás, ser proíbidos de se misturarem com a populaça. Era só o que faltava!