Com a mentira me enganas
Paulo Tunhas, um dos autores do famoso livro Impasses que muitos têm chamado à liça para mostrar a superioridade dos argumentos americanos na guerra do Iraque, escreve hoje no DN um artigo que vale a pena ler na íntegra. Porque, no fundo, ele é revelador da hipocrisia e má-fé com que o campo do sim à guerra tem lidado com o assunto.
Reproduzo uma das partes mais significativas do artigo e mostro onde está a má-fé:
«Indo apenas ao essencial: o ónus da prova da não-existência das ADM cabia, de acordo com a Resolução 1441, a Saddam; Saddam não provou a não-existência das ADM; a posição da França e da Rússia (anúncio de um veto no Conselho de Segurança) acarretou uma suspensão de facto do Direito Internacional; assim, a decisão de entrar ou não em guerra passou a caber unicamente à coligação; isto é, ela não foi 'ilegítima'. Trata-se aqui de matéria de facto.»
A verdade é que nesta argumentação há um ponto em que não existe «matéria de facto» e que prejudica todo o raciocínio. Porque, em Dezembro de 2002, o regime de Bagdad entregou às Nações Unidas o famoso dossier (quilos e quilos de papel) onde respondia, ponto por ponto, às dúvidas da ONU. Perante esse dossier, houve duas atitudes: a dos EUA, que consistiu em pura e simplesmente desvalorizar, e da França, Alemanha e Rússia, que apontava para a continuação das inspecções. Hans Blix, utilizando um raciocínio muito em voga actualmente em Washington, nunca deu como provada a não existência de ADM, mas também nunca deu como provada a sua existência. A posição do campo do não à guerra era de que deveriam ser prosseguidas as inspecções - num horizonte temporal limitado - até se terem mais certezas.
Argumentar-se-á: mas como acreditar nas tais provas de Saddam, se o homem era um ditador e nós não podemos acreditar nessa gente. Pois... mas foi a ONU, com o agreement dos EUA, que assim determinou na famosa resolução 1441.
Daí que tenho muitas dúvidas de que a «suspensão do direito internacional» tenha tido orrigem no campo do não à guerra.
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