segunda-feira, 22 de março de 2004

Carta ao Diabo

Caro Pedro
[será isto chat, ou carta aberta?]
Lamento que tenhas reagido dessa forma ácida. Sou teu leitor assíduo, no blogue e no resto. E gosto do que leio. Quando escreves sobre política e sobre o resto. Um dos últimos textos que não escrevi (tenho uma vasta colecção) era precisamente sobre ti. Tinha acabado de ler, no Independente, um texto teu sobre o Bloco de Esquerda (partido que nem sequer é da minha particular simpatia...), em que, ao contrário da papagaiíce generalizada da direita, tu tentavas compreender e explicar o «fenómeno». Compreender não significa aderir, ao contrário do que se tornou hábito pensar cá pelo burgo. E cheguei a alinhar uma coisa qualquer que teria algures uma frase em que dizia que a «expressão direita inteligente deveria ter sido inventada para falar de PM». Ainda bem que não o fiz - provavelmente, dirias agora que o que eu queria era atirar-me a outros (o que era verdade) e não falar de ti (o que era mentira).
Ao longo dos meses de existência do TdN, meti-me várias vezes contigo (bicadas, como tu dizes) e o registo, pensava eu, foi quase sempre simpático - as miúdas, as fotos das miúdas, o tom que usas quando falas dos teus (des)encontros com as miúdas. Acho que apenas uma vez trocámos bicadas, como tu dizes, sobre o improvável tema da Libéria (!). Na altura, ao fim da primeira ronda, deixaste-me a falar sozinho - deveria ter percebido que não querias conversa. Paciência...
Obviamente, não te quero obrigar a polemizar sobre seja o que for. Tenho com que me coçar - nota, não me queixo, gosto. Registei apenas que a notoriedade mediática parece ser proporcional a um certo autismo. Do qual, sinceramente, não gosto. Acho que, numa sociedade saudável, quanto mais presença mediática se tem, mais obrigações se adquirem. Mas, é claro, sou eu que falo em obrigações, tu ou outro qualquer são perfeitamente livres de fazerem o que entenderem.
Achas que, no fundo, eu gostaria de discutir jornais portugueses. Garanto-te que não corresponde à realidade. Quando criei o blogue, a minha intenção era fazer aquilo que faço - opinar sobre tudo e mais alguma coisa, quando tudo e mais alguma coisa me interessa. Isso inclui, seguramente, os media. Mas não inclui, por exemplo, o Diário de Notícias - a única vez que falei dele com alguma profundidade foi em Julho ou Agosto do ano passado, numa troca de bicadas, como tu dizes, com Pacheco Pereira. Quando JPP aceitava discutir, imagina há quanto tempo...
O Diário de Notícias - e é disso que falas quando falas de «jornais portugueses» - não me interessa em termos de debate público. Interno, sim, se para isso houvesse condições. Até mesmo contigo, que, apesar de colaborador, és das poucas coisas positivas que lhe aconteceram nos últimos dois anos.
Deixa-me dizer-te ainda que considero uma perfeita tonteria isso da acidez (que raio de palavra...) e do enviesado que vês na minha escrita. Sou dos poucos que, neste mundo dos blogues, chama sempre os bois pelos nomes, critico quando quero criticar e quando critico ponho os nomes. A cordialidade que dizes sentir no nosso trato superficial nunca impediria a frontalidade de uma discussão séria se alguma vez tu estivesse para aí virado.
PS: dito isto, permite-me a liberdade de manter o link do Dicionário na coluna da direita. Leio, continuarei a ler, e aconselho quem passa por aqui a ler.