A crise dos media
Passei na banca e não consegui comprar o jornal. O ardina - chamemos-lhe assim - estava afogado em tachos e panelas, fascículos e coleccionáveis, coisas sem fim. Um bazar chinês, como tantos que por aí florescem. Olhou, então, para mim o ardina e disparou: «Não quer antes a porcaria deste DVD que é quarta vez que aqui chega? Ou a quinta História de Portugal, a oitava enciclopédia, a reprodução das abelhas explicada às criancinhas?». Os olhos saiam-lhe das órbitas e aproveitei a chegada de mais uma carrinha da distribuição - é quinta-feira e começavam a distribuir o saco do Expresso - para, discretamente... basar. Eu disse basar? Ou seria... bazar?
Esta semana, o pequeno mundo (cada vez mais pequeno, diga-se) dos media portugueses ficou a saber aquilo que já sabia - que, no primeiro semestre do ano, se venderam menos jornais, menos revistas. Olha que novidade, há semestres que é assim.
E, curiosamente, foi nestes semestres que as tais promoções se especializaram. Sejamos sérios - nunca se venderam tão bons CD, DVD, livros, coleccionáveis e afins nas ruas de Portugal. Há produtos para todos os gostos, mas a maioria é de qualidade. Romances e ficções, investigações e reedições. Tudo de alta qualidade, ajustado ao público - target, dizem eles -, tudo muito bem acondicionado.
Mas os jornais e as revistas continuam a vender pouco. Muito pouco. Cada vez mais pouco.
Porque a verdade é que, nos últimos semestres, as empresas de media esqueceram-se daquilo que nunca se lembraram nos muitos anos que já lá vão - investir na alma do negócio. É verdade - antes de venderem tachos e panelas, botões para as lapelas, os jornais vendiam notícias, histórias, sonhos até.
E, agora, diga-me lá - há quanto tempo não lê uma boa reportagem feita por portugueses num jornal português. Daquelas reportagens que levam mais que três horas a investigar e mais de duas a escrever. Que não se fazem ao fundo da rua, na casa da vizinha, num canto da redacção?
Pois, jornalismo. É disso que se têm esquecido de fazer as empresas de jornalismo. A resposta até está nos tais barómetros semestrais - os poucos jornais e revistas que ainda se vão aguentando, que perdem menos leitores, são aqueles que ainda vão investindo umas migalhas em jornalismo. As outras, parece que fazem bons negócios com tachos e panelas. Porque não mudam definitivamente de ramo?
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