Entendamo-nos.
Encontro em Hugo Chávez mais defeitos, muitos mais, que qualidades. Por exemplo:
1. A ligação às forças armadas. Desde a tentativa de golpe de estado de 2002, o regime ficou totalmente militarizado (se assim não fosse, há muito que a oposição já teria derrubado Chávez através de outro golpe). É inaceitável que uma democracia encontre na força das armas um dos seus principais sustentáculos.
2. A crescente politização do sistema judicial, nomeadamente ao nível superior (supremo).
3. A ideologia claramente ultrapassada e inaceitável, misto de um marxismo não assumido com um personalismo bacoco.
4. etc, etc.
Apesar de todas estas reticências, noto o seguinte:
1. Em três anos, a oposição não conseguiu chegar a um programa comum. Pelo contrário, a oposição política, pura e simplesmente, desintegrou-se e a condução do processo de contestação a Chávez foi entregue à oposição económica - os empresários (fala-se sempre em sindicatos, mas isso é uma palermice - os sindicatos, tal como os conhecemos, não existem na Venezuela).
2. Durante estes três anos, a oposição não conseguiu fazer passar a sua mensagem, apesar de, através dos empresários, controlar mais de 90 por cento dos media, incluindo as principais estações de tv. E a generalidades dos media privados são autênticas máquinas de propaganda da oposição.
3. A economia da Venezuela (e talvez seja essa a sua maldição...) assenta totalmente no petróleo e, apesar dos gigantescos negócios das últimas décadas, a pobreza não parou de aumentar - as descomunais favelas que rodeiam Caracas são anteriores a Chávez. É, por isso, perfeitamente natural que os venezuelanos virem costas a uma oposição herdeira directa desse tempo pré-Chávez e que nada de novo tem para lhes propôr.
Em síntese: para milhões de venezuelanos, Chávez representa, pelo menos, a esperança de dias melhores. Diz-se agora que a redistribuição de riqueza com base no petróleo é insustentável a prazo. Que seja, pelo menos haverá alguma redistribuição durante algum tempo. No fim, a situação será certamente mais equilibrada e, depois de Chávez, chegará alguém que perceba que um país com as potencialidades da Venezuela pode fazer mais qualquer coisa que viver à custa do dinheiro fácil do petróelo.
Esclarecimento adicional ao nosso estimado
Jaquinzinhos: também critico que países, como os EUA, que não se importam de fazer volumosos (e são mesmo muito volumosos...) negócios com Chávez, perante um referendo validado por observadores internacionais insuspeitos, venham contestar os resultados. Esse isolamento a que os EUA votam quem não abana a cauda a cada uma das suas directrizes talvez seja o principal factor de fortalecimento de figuras como Chávez.